sexta-feira, 18 de abril de 2014

Sheherazade, vamos linchar alguém nesse sábado?



Quem não queimou o Judas?
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Estamos próximos do sábado da aleluia. Se não for os poucos tradicionalistas da região do Cambuci, na rua Lavapés, não vejo mais notícias sobre a queima de bonecos de Judas. Lembro-me de quando menino pequeno em Rio Preto, eu e meu irmão quase não dormirmos nos dias que antecediam ao sábado. Já na sexta-feira santa, quando minha mãe me levava a procissão que saia da Basílica da Boa Vista, do momento máximo que era o canto de uma senhora beata, nossa vizinha, que mostrava o rosto de Jesus impresso no pano e paralisava a todos. Depois de vela comprida na mão, com um copinho de papel para se proteger dos pingos da parafina, voltávamos ao recinto da igreja e via-se o padre encerrar a procissão e rezar a missa da Paixão. Voltava para casa de alma lavada. Menino ansioso, não fechava os olhos para que o sábado nascesse logo. Cheio de pano velho e palhas, montávamos costurando uns três bonecos. Naquela época não dávamos nomes, mas ouvia-se muito os adultos comentando que poderia ser um Jânio Quadros, Adhemar de Barros, Carvalho Pinto, Carlos Lacerda, João Goulart e outros muitos políticos da época, coisa que não mudou, pois até hoje, se formos queimar algum boneco, os nomes serão Lula, Alckmin, Dilma, Haddad, Kassab, serão lembrados. Mas como moleque, espírito de porco como meu tio Elias me chamava, fomos amarrando os bonecos no poste para aguardar ansiosamente a chegada da noite e começar a pancadaria. Sempre com os olhares atentos de meus pais e alguns vizinhos, zelosos pela segurança da gente e da rede elétrica, pois poderiam ficar se energia caso o fogo subisse e atingisse a fiação. Escurece, coloca-se fogo e começa a malhação. Os olhos atentos e os sorrisos de criança na maior diversão. Paulada pra todos os lados, e os pobre bonecos se despedaçando. Sinto agora o que se passou na cabeça da jornalista do SBT, Sheherazade, quando disse que concordava que a população fizesse justiça com as próprias mãos na ausência das autoridades, quando um ladrãozinho pé de chinelo ficou amarrado no poste. A ira contagia os mansos, a histeria coletiva é forte que até cega as pessoas e assim um grupo pode se entusiasmar e descer o cassete. Pena que a tradição está acabando. Pena que não podemos descer o pau nos bonecos, assim descontaríamos nossa decepção neles.
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Às vezes a sociedade tem a válvula de escape e não se apercebe. Mas fica o convite, amanhã é sábado da aleluia, pegue seus amigos e monte um boneco, dê um nome pra ele e desça o cassete. Verás que sua decepção naquele momento possa encontrar uma solução por mais momentânea que seja, extravasando tudo que há de ruim na sua mente. Quem você gostaria de malhar, hem Sheherazade?  Algum político?

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