segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

Expectativas & realidades

Amigos, volto neste post, a abordar histórias do nosso cotidiano que presencio nos ônibus. Este post intitulo como expectativa e realidade.

O estrato social de pessoas que se utilizam do meio de transporte, são de gente mais simples, humildes, componentes no maior segmento das classes sociais. Em sua grande maioria é composta de classe D e C. Também integrantes da classe média se valem dos coletivos. Vejo muitos estudantes oriundo de classes mais abastadas. Os idosos, até sendo de classe média, pela gratuidade após os 60 anos, usam bastante. E esse é o meu caso. Mas o maior contingente de usuários são pessoas trabalhadoras em empresas e lares como domésticas e ou faxineiras, espalhadas em toda a cidade. Tanto que a partir da madrugada os ônibus ficam totalmente lotados. No horário de pico que vigora por todas as manhãs e finais da tarde.


Como sou habitué de ônibus, e tendo um compromisso no centro da capital, hoje pela manhã, peguei um no Terminal da Lapa, próximo de onde moro, às 9:30 h, horário em que os ônibus estão com a lotação quase vazia. Portanto, dava pra ouvir as conversas junto ao motorista e o cobrador. Também tem a fidelidade de alguns passageiros por conta do trajeto e horário. Aí surgem as amizades inusitadas entre os tripulantes e os usuários. 



Ao iniciar a viagem. O motorista é abordado por uma senhorinha já sexagenária, que começa o diálogo. - Sumida, faz tempo que a senhora não aparece, diz o condutor. Ela responde que a situação está complicada, familiares, netos, nora… a rotina está dominando a possibilidade de sair. E ela reclama que desejaria poder viajar no período natalino, mas sem folga e com as férias dos netos, tudo a impede de desfrutar de um belo passeio ou viagens fora do seu domicílio, não vai conseguir e se conforma.

-E você, fulano? Vai viajar agora nesta época do Natal?

Em seguida prontamente ele responde: - Já viajei este ano. Fui para Serra Negra, em julho passado. E agora neste período natalino, como já cumpri minhas férias, permanecerei aqui na Cia. levando e trazendo passageiros como a senhora, que não irão ter descanso. Muita gente vai trabalhar.


Fiquei pasmo. Como a realidade de pessoas humildes e os trabalhares das classes menos privilegiadas é diferente. Eu, um bom burguês de classe média, acostumado com viagens para outros destinos longínquos no território brasileiro ou viagens internacionais pelo mundo afora, me vejo pensando o quanto é importante para esse trabalhador, uma viagem até um destino de 50 ou 100 quilômetros daqui.


Esse cenário me transportou aos tempos de adolescente na minha cidade do interior. Lá eu acompanhava atento as notícias da nossa elite em suas viagens de férias ou lua-de-mel da alta sociedade. Sabem quais eram os destinos “de luxo”? As férias de inverno, o destino era Campos de Jordão, Gramado e alguns poucos mais abastados seguiam pra Bariloche. Nas viagens de lua-de-mel, o destino principal era Poços de Caldas, Búzios e em menor número, Guarujá, destino esse que crescia nas férias de verão. E no meu caso, meus pais iam para um destino bem próximo, na cidade de Santos. Outros escolhiam ir até Praia Grande e Cidade Ocean. Falar em viagens internacionais, o máximo era para Buenos Aires.


Quanta mudança em pouco de 50 anos. Tudo se transformou. O poder aquisitivo foi fator de progresso em toda a sociedade. Os pais começaram a trabalhar, a renda familiar aumentou, facilidades de crédito, parcelamento das passagens aéreas, hotéis e outros acessórios para viagens que acabam se tornando facilitadores para tal intento. Entretanto nestes 50 anos, as condições para viagens evoluíram, porém as condições sociais não acompanharam na mesma proporção. A população não teve o crescimento do poder aquisitivo e pelo contrário, as pessoas da classe C e D, passaram muitas transformações sociais e perda do poder financeiro para poderem desfrutar de lazer e entretenimento. Na verdade o abismo aumentou. Quem podia ir à Buenos Aires hoje vai à Paris, Roma, New York, Londres, Dubai… e quem ia para Campos do Jordão, no máximo vai até Serra Negra e Águas de Lindóia.


Esse é o país que nos foi entregue. Famílias dos tempos antigos e os de hoje. Trabalhadores de hoje que de acordo com suas possibilidades e acesso aos trabalhos qualificados, escolhem seus momentos de pausa com algumas expectativas, mas que na realidade, são obrigados a cumprirem o que dá pra ser feito ou não. Os mais pobres não tem expectativas. Tem a dura realidade, que muitas vezes, a viagem é de trabalho, na dura rotina da sobrevivência. Do Jardim Peri-Peri à Praça da República ou Praça Patriarca, ambas no centro antigo de S. Paulo. 

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