terça-feira, 2 de novembro de 2021

Uma viagem no assento gratuito.

 Adoro contar aqui algumas curiosidades.

E esta que narrarei a seguir aconteceu recentemente quando viajei para SJRio Preto neste final de outubro de 2021. 


Fui para minha terra natal cuidar de algumas pendências surgidas após o falecimento de minha querida mãe, Odete, ocorrida em fevereiro deste ano e atrasadas pelo fato da pandemia ter ficado mais forte, com a segunda onda, justamente a partir daquele mês. 


Com o preço atual dos combustíveis, praças de pedágio cobrando preço de doido, pelo fato de ir dirigindo sozinho, com o preço abusivo de uma passagem aérea, me levaram a escolher a viagem rodoviária por ônibus.


Pois bem, lá fui eu, todo paramentado com as recomendações do protocolo sanitário contra a Covid. Máscaras, frasquinho com álcool em gel, e torcida para não ter nenhum problema de saúde com os outros viajantes, principalmente com o passageiro que faria a viagem ao meu lado.


Como todos sabem, já sou um veterano, aposentado, além de idoso beneficiado com a indefectível vaga gratuita nos transportes coletivos, principalmente nos intermunicipais que reservam os dois primeiros lugares, concluo portanto, que eu irei com outro idoso (a) ao meu lado. Seria certeza. Pelos menos, já sabia que seria uma pessoa com as duas ou terceira doses tomadas. Meu temor já havia diminuído.



Bem, após rumar para estação rodoviária, apresento o bilhete ao motorista da Viação Cometa e entro no ‘busão’, preocupado com o meu assento número 01, janela. Acomodo minhas bagagens no bagageiro apertado e pequeno, por sinal. As minhas mochilas, duas grandes, traziam as lembranças de uma vida. Trazia algumas peças que resolvi tirar de minha casa em Rio Preto. Peças cujas recordações me reportam à infância. Com certeza fariam um bem tê-las junto comigo nos dias de hoje. Uma mistura de sentimentos, tristes e alegres. Me levando a estar junto com a saudade dos meus queridos pais, que partiram deste mundo.


Lá estava uma senhora. Idade sexagenária. Nas poltronas imediatamente atrás, trazia um filho atento. Ofereci o meu lugar pra ele vir ao lado da mãe, recusou-se e agradeceu minha oferta. E aí ofereci a janelinha para a senhora, que prontamente aceitou. Fiquei com o corredor. Sempre levo um livro comigo, leio e pouco converso. Mas tive que interromper a leitura. Causa maior! O celular daquela senhora não para de chamá-la. Era “mainha” pra lá, “mainha” pra cá. Isso durava em quando ela ligava e recebia ligações da multidão de parentes. 


Aqui cabe uma constatação fantástica. O advento do WhatsApp com uso do áudio através da ferramenta. Basta clicar o ícone 

🎙(microfone), gravou, enviou, recebeu, ouviu, e repete o processo e segue o ônibus. Esse moto contínuo seguia viagem afora.

A senhorinha pode ser tudo. Não ter estudo suficiente para entender os meandros da tecnologia como hashtags, arroba, copia&cola, efeitos permitidos por aplicativos, etc. Mas um coisa ela conhecia. Clicar no microfone 🎤 e gravar as mensagens. E isso já bastava para viagem ser narrada e comentada juntos à parentela.


Independentemente do vocabulário que ouso não repetir por respeito a velha senhora. As vezes eu ficava surpreso pelos assuntos discutidos e alinhavado com os seus interlocutores. Porém, uma conversa eu gravei na mente. Serviu para me mostrar que a sabedoria popular, apesar da falta de oportunidades que o pessoal do estrato mais simples da sociedade tem. A falta da acesso ao ensino educacional compromete muito o conhecimento delas, mas não significa não aprender nada. Ter uma ignorância plena e não permitir aprender algo repetido por outro que saiba mais.


A razão de ser uma ferramenta de uso geral, desde o mais simples cidadão até o mais culto. Trata-se do aprendizado pelo efeito boca-a-boca. Uma fenômeno da comunicação social. A nossa tradição oral encontra no áudio do WhatsApp o seu porto seguro da população que é treinada através dessa facilidade oral do que a escrita. Falar não precisa de acentuação, vírgulas, plural, conjugação verbal. Pronto. Está tudo contribuindo para uma conversação. 


Voltando ao que me recordo daquelas conversas. A certa altura do trajeto, após a parada do ônibus, saindo do local, muito conhecido por quem viaja nas rodovias, onde tivemos acesso ao restaurante, toalete, lanches, salgadinho, água, refrigerantes, excelente hora para ligar ou receber a ligação de alguém. A pessoa do outro lado da chamada, pergunta onde ela se encontra. E prontamente responde. “ - Tô saindo do Gralllllllllllllll.” Na verdade é rede Graal, mas as pessoas insistem em eliminar o ‘A’ dobrado e aumentam o ‘L’.


Mas outra sacada da senhorinha que me surpreendeu muito foi quando um ente ao ligar para ela e sua fala tratava de algum animal de estimação, gato ou cachorro, não consegui identificar. Mas, cujo animal teve uns filhotes. Segundo a narrativa dele, nasceram vários filhotes, onde metade tinha a barriga de cor branca e dorso preto, enquanto o restante era o contrário, dorso branco com a parte da barriga cinza escuro com umas patas brancas, e que não puxaram pelas cores e feitio da mãe. Parece que a pessoa do outro lado da ligação estava querendo saber as causas e qual animal macho cruzou com a fêmea deles.


Silêncio absoluto. Até pareceu que a ligação havia caído. Interrupção? Que nada. Eis que para a minha surpresa, a senhora responde sabiamente.

“ - Pela maneira que você descreveu as formas e cores, vai ficar difícil descobrir o pai. Assim deveremos procurar o programa do Ratinho, para fazer um teste de DNA”, provavelmente veterinário, complemento. (Risos)

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