quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

2568, um dos muitos números que marcaram minha vida.

2568. Este número marcou muito a minha vida. Mas que raios é esse número? Todos sabem que eu sou da geração pós guerra, a Babyboomer, fruto dos anos ‘50. Pois então, como todo antigo, tínhamos em nossa casa no interior um daqueles telefones feitos de baquelite, uma resina sintética, tipo plástico rígido negro (melhor falar assim, do que preto) é melhor politicamente, e na cidade pequena os números eram em função da aquisição da linha telefônica. Portanto éramos a 2.568a linha da cidade de S. J. Rio Preto, SP, e essa Cia. era de uma família de árabes bem abonados financeiramente, se não me engano, de nome Moysés Haddad, tradicional família de libaneses que tinha uma enorme atuação comercial, um verdadeiro conglomerado, porém mais tarde na época das grandes aquisições por parte dos governos estaduais, fora adquirida pela recém estatal fundada nos anos’ 70 (1973), a Telesp SA.


A partir daí os números foram alterados e aumentadas. A pequena milhar, virou uma sequência de seis números, mas depois disso, eu já estava adulto e estudando fora, portanto não mais me valendo das ligações telefônicas.

Lembro bem do local onde o aparelho estava instalado. A pedra de mármore permanece até hoje no mesmo local. Hoje virou um porta agenda de avisos e anotações. Os fios da ligação, que em uma determinada época foram destruídos por uma cadela abilolada, Melissa, a doida, permanecem ainda embutidos na parede. Apenas estão como decoração, os telefones fixos viraram obra de museu. A nossa secretária eletrônica aposentou-se antes que o governo atual modificasse as regras anteriores. Ufa. Valeu.

Nossa casa, com dois quartos, sala de estar, sala de jantar, banheiro, copa e cozinha, além da varanda e jardins na frente e um enorme quintal com uma edícula que guarda até hoje livros antigos na estante de mogno e outros trecos antigos. Quando o som de chamada do telefone tocava, ouvíamos de qualquer local que estivéssemos. Lá corria, meu falecido pai, isto é, quando ele estava por lá. Ou quase sempre a minha querida mãe atendia.

Nossa casa ficava na rua Prudente de Moraes, 2446.
Meu pai falava ao atender: dois, cinco, meia dúzia, oito, e em seguida completava, Hatim Salim é quem fala. Já a minha mãe dizia: Residência do vereador Hatim Salim ou apenas Residência de Hatim Salim. Eu e meu irmão mais velho, Hatim Jr, quando atendíamos, dizíamos: Pronto ou alô. Simples assim.

Quantas lembranças. Lá tivemos muitos momentos de alegria. Votos de felicidades nas comemorações de nossos aniversários, festas como Páscoa, Natal e Ano Novo.
Também de grandes tristezas pelas mortes de meu avô, tios e parentes próximos. E o maior deles, o desastre que meu pai sofreu na estrada Washington Luís na região de Taquaritinga, SP. Quando o carro em que estavam, ele e mais dois amigos, atravessou as barreiras e caiu em uma vala em construção. E fomos avisados na madrugada através do nosso telefone número 2568.

Nele também informei que havia passado no vestibular na capital. Depois os convidei para virem na minha formatura. Em 1977
Meu saudoso pai, Hatim, ao centro com amigos.

, nele avisei que ia levar a minha noiva para que eles, meus pais, conhecessem a ela e os pais dela que iriam viajar juntos para Rio Preto e lá marcamos o casamento.
Nele avisei que meu primogênito, Jorge Arthur, havia nascido em 26 de julho de 1980. Nele informei tantos fatos de minha vida em S. Paulo. Do meu outro casamento em 1985 e os nascimentos de mais duas filhas, Nadine, em 1988 e Micaela em 1997. Também recebia as notícias oriundas de minha cidade natal. Um canal de comunicação de mão dupla.

Com o passar do tempo fui sendo preparado para receber notícias de casa. E chegou um tempo em que as notícias esperadas seriam preocupantes. E chegou aquele momento em 08 de novembro de 2007, da internação de meu querido irmão. Sigo desesperado para Rio Preto e durante a viagem, cerca de cinco horas de estrada, o meu querido irmão na resiste a internação e falece. Nessa hora, recebo via fone a notícia trágica.

Nem completado um período de um ano, volto a receber outro telefonema. Meu pai, Hatim com 86 anos é internado. Desde vez, sigo por avião, menos de uma hora, chego a Rio Preto. Na manhã seguinte em horário previamente determinado, 10:00 h, visito meu querido progenitor na UTI. Ele me pede para beber guaraná. Foi esse o seu último desejo e o momento final que eu o vi, vivo e falando comigo. Ao final deste dia, o telefone me informa que devo ir até o hospital. Uma ligação antes do horário de visita noturna, já senti o drama. Ele nos deixava naquela tarde de 02 de julho de 2008. E eu acabo usando o telefone para informar aos familiares e amigos próximos daquela notícia fatal.

Um simples telefone. Um canal de comunicação usado atualmente como vídeo chamadas. Uma história rica de uma família e suas gerações. Hoje, atualmente vejo minha mãe por FaceTime. Enquanto a vejo e ela também o faz instantaneamente. Isso, nesses tempos de pandemia é super importante. O que eu não pagaria para ter essa tecnologia lá no passado. As coisas, talvez não seriam alteradas pelo destino já determinado, mas o conforto de tê-los visto mais vezes, seria uma dádiva, uma verdadeira redenção.

E é vida que segue, ficamos na dependência de outros caprichos do destino e do toque dessa ou daquela ligação. Se boa ou ruim, as emoções sempre disparam fortemente ao tilintar da campainha. Haja coração, como diria o nosso indefectível Galvão Bueno.
Quando é que receberei os próximos telefonemas que não sejam os tradicionais e chatíssimos telemarketing?
Alô, alô, alô...quem fala?

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