quinta-feira, 20 de março de 2014

Tudo a declarar. Sou pai de um jovem Down.


Depoimento do pai de uma criança com Síndrome de Down*.
Em comemoração ao Dia Internacional da Síndrome de Down, celebrado hoje em 21 de março, declaro solenemente o meu amor incondicional pelo meu filho Jorge Arthur.
Fruto do meu primeiro casamento com Sônia Regina, aliás o meu único casamento oficial, em 1978. O Jorge Arthur, que carinhosamente chamamos de Jota, nasceu em 26 de julho de 1980. Após um parto muito sofrível, pois Regina entrou em trabalho de parto na noite anterior e fomos para a maternidade em Guarulhos na madrugada de 26 de julho. As enfermeiras atendiam muitas grávidas que lá chegavam aparentando que teriam os bebês, mas eram liberadas e orientadas para voltarem para casa.
Porém o nosso caso foi encaminhado para fazer o parto cesárea a pedido da médica que nos assistiu durante a totalidade dos pré-natais. Pela manhã a doutora chegou e após a cirurgia do parto, veio o nosso Jotinha. Felicidade geral! Era um guri, pois na família só havia nascido meninas. O clima de felicidade imperava e inibiu os olhares dos familiares.
Quando peguei o bebê nas minhas mãos, ao beijá-lo, vi aqueles olhinhos amendoados e logo abri a mão direita e constatei a prega palmar transversa, uma única prega na palma da mão, em vez de duas. Fechei os meus olhos e agradeci a Deus. Bem antes de me casar, em minha cidade natal, S. José do Rio Preto, quis o destino que eu fosse voluntário na APAE local.
Talvez fosse o aviso. Talvez quisesse o destino me preparar. Vindo em São Paulo procurei fazer esse mesmo trabalho na APAE daqui. Não consegui, porém fazia trabalhos junto com os meus alunos. Visitávamos algumas entidades que assistiam crianças deficientes, como Cruz Verde e algumas creches de crianças carentes. Dai o meu agradecimento a Deus, fui escolhido por ele. 
Ser pai de um Down não é pra qualquer um. Depois tive que trabalhar a ansiedade da Regina e dos meus sogros. Cheguei a ouvir do pai dela que Deus havia castigado sua filha. Quanta decepção. Muitos não estão preparados para ter decepções. E mais tarde, já entendendo melhor a deficiência do neto, foi ele quem mais curtiu as travessuras do pequeno Jotinha.
Tentamos colocá-lo bem cedo em escolas especiais. Nos anos 80, a sociedade não estava organizada. Havia poucas escolas e poucos professores para cuidar do Down com se faz hoje. Penamos. Ele esteve em, pelo menos, cinco escolas. Com a minha separação, tivemos mais problemas. Distância, relacionamento atritante entre os pais. Mas o tempo e a vida foram moldando-o e ele cresceu, virou adulto.
Do meu segundo casamento, veio a meio-irmã, Nadine. Julguei que haveria uma melhora nas relações familiares, porém não foi como eu desejava. Mais tarde, com a minha segunda filha, Micaela, quis o destino nos marcar novamente. Na escola do pré-infantil, uma criança Down foi matriculada e a minha filha foi escolhida para ser a colega guia. Ó Deus que presente! Corri dizer para todos. Isso era mais uma mensagem divina.
Pois então, hoje estamos com o Jotão. Vai completar seus 34 anos em julho próximo. Outro dia escrevi sobre os meus filhos, cuja diferença entre eles é de nove anos. São os meus verdadeiros tesouros.
Muitos pensam que o nome down na tradução direta do inglês, baixo, pra baixo, etc... Nesse caso diria, não é. Recebe o nome em homenagem a John Langdon Down, médico britânico que descreveu a síndrome em 1862.
Se fosse simples assim, eu iria parodiar. Se a criança é down para maioria dos ignorantes, para os amigos, parentes e principalmente para os pais, é Up. Tenho muito orgulho de ser um pai-down. E digo brincando para as pessoas, pois os Down, apesar de terem características muito semelhantes, ele recebem a carga genética dos pais, e o seu único defeito genético herdado de mim é o fato de não gosta de dançar.
Filho, hoje nesse dia em homenagem aos portadores de Síndrome de Down, uma baita beijo e um abraço forte. Te amo. Sempre amarei.

* A trissomia 21 (também chamada trissomia do 21) é a causa de aproximadamente 95% dos casos observados da síndrome, com 88% dos casos originários da não-disjunção meiótica no gameta materno e 8% da não-disjunção no gameta paterno 11.
Neste caso, a criança terá três cópias de todos os genes presentes no cromossomo 21. 

2 comentários:

  1. Salim... é para chorar, emocionar, arrepiar.
    Realmente são UP...
    Temos um Miguel... é a nossa vida, tão UP, que fez toda família ser mais família no verdadeiro sentindo.

    Beijocas.

    Ester Rosa.

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  2. São verdadeiras dádivas de deus. Famílias são escolhidas, com certeza. Bjs

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